Estado de medo

Por Roberto Cavalcanti

Não sou homem de mandar recado. Minha tradição (e gosto de cultuá-la) é da conversa franca e pessoal.

E sei que este é, também, o perfil do governador Ricardo Coutinho. Sua trajetória comportamental mostra que ele não é homem de ouvir recados, principalmente à distância.

Uma trajetória, aliás, que merece meu profundo respeito. Desde sempre. Da vereança ao governo. Reforçada e consolidada ao longo do tempo.

Faço estas ressalvas, como quem coloca os pingos nos is, para evitar múltiplas interpretações no desabafo que o cidadão Roberto Cavalcanti não consegue mais calar, se ausentar ou tampouco ignorar.

E este cidadão está cansado de testemunhar a escalada da violência – um fenômeno que, não posso deixar de reconhecer, é reflexo de um Brasil fora dos trilhos. E que atinge a todos de forma endêmica e disseminada.

Esse entendimento, porém, não minimiza o impacto dos estragos causados pela criminalidade. Especialmente quando ela bate a nossa porta.

É realmente difícil – intolerável mesmo – assistir a um comerciante tolhido de exercer seu ofício por medo das hordas de assaltantes.

É impossível aceitar a crescente legião de amigos – de todas as classes sociais – sendo alvos da violência.

É impossível, sobretudo, assistir ao Estado capitular ao banditismo.

Nunca na vida – e a Paraíba é testemunha disso – capitulei diante da violência. Nos conflitos do passado, que tantos conhecem, mantive meu direito de ir e vir, mesmo sabendo que a espreita armada aguardava um vacilo, uma brecha, para operar.

Não prosperaram. Exatamente porque sempre reagi com equilíbrio e altivez diante dos meus inimigos.

Capitular, jamais.

E sei que o governador Ricardo Coutinho, por suas características de coragem pessoal, também não se rende nem se entrega.

A força pessoal do governante e o perfil histórico da Paraíba – a pequenina que enfrentou o cangaço de Silvino a Lampião – torna ainda mais inacreditável, aos nossos olhos, a visão de um Estado que capitula e vive sob o julgo dos criminosos.

Numa terra de bravos, como aceitar a covardia?

Como relativizar a presença de bandidos nas ruas, exibindo ostensivamente suas armas, fechando vias públicas, tomando cidadãos como reféns, enquanto a polícia se recolhe?

Meu choque foi intenso ao ler, lá de Brasília, a manchete do Correio da Paraíba, edição de terça-feira 26. Em letras garrafais, a Segurança Pública se rende sobre a ação criminosa no Bessa: “A PM sabia do ataque, mas não reprimiu”.

E eles não douraram a pílula: “Falta estrutura para enfrentar bandidos que explodem bancos. Eles usam calibre 5.56, 7.62, .30 e .50. Nós usamos .40”.

Já estava chocado com declarações de que o Estado não tinha responsabilidade de guardar e preservar o dinheiro dos bancos. Como não? Dinheiro de banco é dinheiro privado? Mais uma razão, então, para ser protegido. Com o agravante de que o banco em epígrafe – a Caixa Econômica – é uma instituição oficial.

A verdade é que, a cada declaração a respeito do reinado do banditismo no Bessa, a emenda foi ficando pior que o soneto.

E a capitulação que veio na sequência foi a pá de cal.

Sim, é responsabilidade do Estado assegurar a tranquilidade operacional das empresas em todos os segmentos.

É responsabilidade do Estado – especialmente pós-referendo do desarmamento – proteger cada casa e cada cidadão.

O Estado não pode se declarar incompetente na missão de garantir a paz e a segurança.

Sob o pretexto de que preservava vidas ao recuar, acabamos por preservar a criminalidade.

Pois preservar a vida não é se recolher. Não é buscar o pé da mesa.

É armar nossas forças policiais. É equipar e aparelhar as tropas. É efetivamente se preparar para o enfrentamento, nunca para o recuo.

Não esperamos por divindades de farda. Nem tampouco onisciência. Mas, ao tomar conhecimento do crime, não podemos tolerar uma polícia que diz: “afasta de mim este cálice”.

Ao fazê-lo rejeitam o papel – constitucional – de protetor do Estado e de seus cidadãos.

Este cálice não pode ser estendido na direção da população desarmada. Ele é exclusivo do aparato público de segurança – que deveria sorver esta missão; tragar o divino ofício de guardar vidas; e expurgar a omissão.

Não é tradição da Paraíba a covardia.

Esperamos, pois, pelo dia em que, enfim, virá a reação.

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