Um elogio à tristeza

Por Zizo Mamede

Estava ouvindo Bob Dylan, “Like a Rolling Stone”. É uma canção triste. Mas é bela, como tantas outras canções feitas de tristeza. Certamente foi cantada num final de tarde de domingo, de um domingo sem futebol.

Há hora mais triste do que um domingo à tarde sem uma partida de futebol? – A minha amiga Maria Lúcia, professora da UFPB diz, entre risos, que “o domingo à tarde é hora de doer e de cultivar a tristeza, independentemente do futebol”.

Penso que vivemos sob uma verdadeira ditadura, a de sermos alegres e felizes o tempo todo, a cada momento, a todo custo. É proibido ser triste, mesmo que seja apenas nos fins de tarde de domingo.

Não ser triste nem infeliz, um momento sequer, é uma imposição da sociedade do prazer e um imperativo da cultura do consumo. É preciso consumir felicidade, sempre.

Tenho uma amiga que ao se sentir triste vai ao salão de beleza. Toda semana ela vai ao salão de beleza, esticar o cabelo e pintar uns tons e sobretons dourados, porque os cabelos brancos são “uma tristeza”.

Conheço criaturas que espantam a tristeza indo ao shopping center para olhar as vitrines, para ver roupas e bolsas de marca. Outras vão a lojas de carros ou de motos. Fazem uma ronda, olham tudo e mesmo que não comprem nada, sacodem a tristeza prá lá.

Penso cá com meus botões, como seria a vida sem as tristezas. Como seria um eterno prazer, uma eterna alegria? Como seria viver assim?

Já pensou a arte sem a tristeza? Como a Grécia nos daria Antígona e Laocoonte? E Tolstoi teria Ana Karenina, a própria beleza triste? E o mundo teria Tolstoi? Como seria Florbela Espanca sem tristeza? Nana Caymmi cantaria “Não se esqueça de mim”, uma pérola feita de triste saudade?

Nestes tempos, em que é proibido se sentir triste ou infeliz, às pessoas é imposta a busca de saídas, de zonas de fuga. Bateu tristeza, é preciso se evadir, por todos os meios e a qualquer preço.

Tenho a impressão que muita gente, por não saber lidar com as tristezas, torna-se dependente de drogas lícitas, prescritas por médicos, vendidas nas farmácias, aos montes. A propósito, nunca soube de um chá para curar tristeza. – Cazuza fala de “algum remédio antimonotonia”.

Atualmente, somos levados a não aceitar que a tristeza faz parte da vida. Mas, por que não encarar o desencontro, a renúncia, uma ausência, uma frustração? Como ser feliz sem ser infeliz?

Faço um elogio à tristeza. Aliás, não há nada de novo nisto. Já cantava Vinicius de Moraes em “Samba da Bênção” que se “é melhor ser alegre do que ser triste … mas para fazer um samba com beleza é preciso um bocado de tristeza, porque senão não se faz um samba não.”

Tristeza dá e passa e do jeito que vem se vai. Para a tristeza não há outro remédio, senão o tempo. Mas o tempo só cura a tristeza de quem sabe que não existe vida sem dor e que a dor faz parte da vida.

Vou escrever um manifesto pelo direito à tristeza. Acho que a tristeza é uma condição para ser feliz.
– O que você acha?

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