A série de reportagens apresentando fenômenos eleitorais nas eleições municipais deste ano na região Nordeste realizada pelo blog do Magno Martins, de Pernambuco, em parceria com o Portal MaisPB, mostra, nesta segunda-feira (05), Edilson Mendes, o Courão da Carrocinha, ex-beneficiário do Bolsa Família eleito vereador na cidade de Monteiro, no Cariri paraibano.
Do Bolsa-Família para Câmara
Com mais de cinco mil famílias contempladas pelo Bolsa-Família, o município de Monteiro, de 33 mil habitantes, no Cariri paraibano, a 305 km de João Pessoa, elegeu para a Câmara de Vereadores um legítimo representante dos excluídos, dependente e ex-bolsista do programa de distribuição de renda do Governo Federal: Edilson Mendes, o Courão da Carrocinha. Ele embolsou o benefício usando um cartão da Caixa Econômica para sacar R$ 186 por mês até as vésperas do registro da sua candidatura, em julho deste ano.
Magro, semblante abatido e de poucas palavras, por ser semianalfabeto, Courão passou fome e humilhações na vida. Seu passado é um livro de dor, sofrimento e traumas. Perdeu a mãe Lúcia Mendes na mesa do seu parto, vítima de eclampse. O pai João Caldeirão suicidou-se quando ele tinha apenas 12 anos. A ex-mulher Liliane, seu único amor em vida, o traiu. Ao abandoná-lo, abriu mão também dos dois filhos, criados por ele e por um casal vizinho no sítio em que mora, que adotou como “pais de criação”.
Aos 40 anos, tendo os últimos 17 anos tirado o sustento da família puxando pelas ruas da cidade uma carroça de madeira que ganhou de presente, em busca de fretes que lhe rendiam entre R$ 30 e 40 por semana, Courão ganhou a simpatia da população e 784 votos nas urnas usando uma frase na propaganda eleitoral ao longo da campanha que mexeu profundamente com o coração de muita gente.
“Eu sou o Courão da Carrocinha. Sou candidato a vereador para representar a pobreza de Monteiro na Câmara. Sei o que é ser pobre, porque já passei muita fome. Se for eleito, vou ajudar aos que passam fome também”, repetia no guia eleitoral do rádio. A estratégia deu certo. Dos 13 vereadores eleitos acabou em nono, com 784 votos. A princípio, quando se espalhou que seria candidato, fruto de uma brincadeira de amigos, ninguém acreditou.
Filiado ao PROS, no cartório eleitoral teve que assinar um documento sustentando que sabia ler e escrever. Na sua inscrição consta que possui o ensino fundamental incompleto. Na prática, num primeiro contato, dá para perceber suas deficiências na leitura, mas o que chama atenção nele são a simplicidade e o respeito que ganhou da população.
Dono de uma loja de móveis usados, Anilton Viana de Queiroz deu a carrocinha que Courão usa até hoje, com data para aposentar em 1 de janeiro, quando troca a dura rotina nas ruas pelo plenário de ar-condicionado da Câmara de Monteiro. “Ele sempre foi uma pessoa muito trabalhadora, de boa índole. Todo mundo gosta dele aqui na cidade”, diz Anilton.
Além de doar, o comerciante permite que Courão faça ponto na sua loja e ainda guarde a carrocinha todos os dias, ao final da sua labuta. No sítio Lagoa dos Catités, a 8 km do centro da cidade, onde mora, o agora vereador eleito é adorado pela vizinhança não apenas agora, mas de há muito tempo. David Moraes, vizinho dele, se emociona toda vez que fala sobre as agruras na vida dele que testemunhou.
No dia da eleição, quando ouviu pelo rádio que Courão estava eleito, David reuniu a vizinhança e fez uma festa. “Daqui, ele saiu com mais de 150 votos. Só da minha família foram 20 votos”, diz o vizinho, que considera o novo parlamentar um herói. “Quando Courão teve um problema na bexiga e ficou muito doente a solidariedade da população foi algo louvável e isso prova como ele sempre foi muito querido”, afirma David, acrescentando esperar dele, agora como vereador, que olhe para a região onde mora e consiga melhorias. “A seca aqui devastou tudo e ele tem que lutar por água”, assinala.
Ao perder sua mãe no parto e mais tarde o pai, que se suicidou com um tiro na cabeça, Courão ganhou Elias Viana e Maria de Lourdes como pais adotivos, mas ambos também já morreram. Mais tarde, surgiu em sua vida outra pessoa bastante importante: a tia Safira Bezerra da Silva. Hoje, com 87 anos, é ela quem ajuda na criação dos dois filhos do vereador – João Victor, de 12 anos, e Caio, de quatro anos.
“Eu tive dó de Courão e seus filhos para mim hoje também são meus netos”, afirma dona Safira, que mora no mesmo sítio de Courão, em frente da sua casa. O vereador a chama de tia-mãe, porque, segundo ele, também ajudou na sua criação. “Sabendo das minhas dificuldades ela trazia de vez em quando um feijãozinho aqui em casa”, relata Mourão, para quem dona Safira apareceu em sua vida como uma benção de Deus.
“Eu deixo meus filhos aqui com ela e vou cuidar dos meus fretes na carrocinha sem nenhuma preocupação”, acrescenta. Depois de tomar posse, com uma mudança brusca de vida, passando e receber um subsídio mensal de R$ 4,5 mil, Courão faz planos de ajudar a família. “Tia Safira já tem o seu pedaço de terra, é aposentada e tem umas cabeças de boi, mas o que eu puder fazer por ela farei”, afirma.
Em terra de juristas, sem a menor noção das leis
Faltando pouco mais de 20 dias para trocar a carroça e os fretes de rua pelo paletó e a tribuna na Câmara de Vereadores de Monteiro, Edilson Mendes, o Courão, não tem ainda a mínima noção do que fará no parlamento. Do regimento, nunca ouviu falar e ideias para projetos de lei ainda não passou uma sequer pela sua cabeça. “O que vou fazer é defender a pobreza”, diz ele.
Na Câmara, reforçará a base da prefeita eleita Lorena de Doutor Chico (PSDB), que teve 11.399 votos, 57,32% dos votos válidos, derrotando o socialista Juraci Conrado de Oliveira, que teve 42,68% dos votos, quase quatro mil votos a menos. A tucana integra o grupo do deputado João Henrique, do DEM, que exerce seu terceiro mandato, tendo Monteiro, sua terra natal, como principal base eleitoral.
O deputado é, também, um dos padrinhos políticos de Courão. “Aqui, todo mundo me ajudou. O deputado mandou fazer o material de minha propaganda e sempre me ajudou, antes mesmo de eu virar vereador”, afirma. Conhecida como ‘A Cidade do Forró’, Monteiro é berço de grandes artistas, como Flávio José e bandas do gênero musical, entre elas Magníficos.
Também é berço do poeta Pinto do Monteiro, um dos monstros sagrados do repente, Zabé da Loca, Dejinha de Monteiro e Ceguinho do Piado. A cidade se destaca, ainda, por ser terra de grandes juristas e advogados, entre eles Djaci Falcão, ex-presidente do Supremo Tribunal Federal e pai do ministro Francisco Falcão, também do Supremo Tribunal Federal.
Djaci Alves Falcão nasceu na cidade de Monteiro no dia 4 de agosto de 1919. Filho de Francisco Cândido de Mello Falcão, natural de Pernambuco, e de Inês Alves Falcão, natural da Paraíba, bacharelou-se em Direito, pela Faculdade de Direito do Recife, em 1943. No ano seguinte, após obter o primeiro lugar em concurso, ingressou na magistratura do Estado de Pernambuco. Em março de 1957, ascendeu, por merecimento, ao cargo de desembargador do Tribunal de Justiça de Pernambuco, sendo eleito presidente do órgão em 1961.
A partir de dezembro de 1965, passou a integrar o Tribunal Regional Eleitoral do mesmo Estado, assumindo a sua Presidência em 1966. Nomeado ministro do STF, tomou posse no cargo em fevereiro de 1967. Foi indicado juiz efetivo do TSE e eleito vice-presidente, tendo assumido as respectivas funções em 11 de fevereiro de 1969. Reconduzido por mais um biênio, chegou à presidência em 11 de fevereiro de 1971, permanecendo até fevereiro de 1973.
Nessa mesma data, Djaci Falcão foi eleito vice-presidente do STF, sendo empossado para o biênio 1973-1974. Assumiu a presidência da instituição em 14 de fevereiro de 1975, exercendo-a até fevereiro de 1977. Deixando o cargo, passou a presidir a Segunda Turma, até a aposentadoria.
Na economia, Monteiro se destaca pela caprinocultura e ovinocultura, cujo grau de desenvolvimento está entre um dos mais altos do Nordeste. Seus rebanhos também são um dos maiores da região, além de ter animais com alta qualidade genética e criadores renomados nacionalmente.
Antes de surgir oficialmente na história, Monteiro era uma área de fazendeiros e criadores de gado. No final do século XVIII, algumas famílias lá se estabeleceram e, em 1800, Manoel Monteiro do Nascimento desmembrou uma área de sua fazenda, chamada Lagoa do Periperi, para construir uma capela consagrada a Nossa Senhora das Dores, distante 300 metros da margem do Rio Paraíba.
A beleza do local foi atraindo habitantes e, em pouco tempo, formou-se um povoado que, em 1840, deixou de ser Lagoa do Periperi e passou a se chamar Povoação da Lagoa (havia apenas duas casas de telha na época). Pouco tempo depois, em homenagem ao seu fundador, o povoado recebeu o nome de Alagoa do Monteiro.
O distrito de Alagoa do Monteiro foi criado pela Lei Provincial nº. 194, de 4 de setembro de 1865. A cidade foi sendo erguida à margem do Rio Paraíba, que nasce na Serra do Jabitacá, a 24 quilômetros da cidade. Tornou-se município por meio da Lei nº 457, de 28 de junho de 1872, com território desmembrado de São João do Cariri.
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