DA AURORA DA MINHA VIDA

Por Zelito Nunes

Chico Mendes chegou na nossa propriedade ainda em fins da década de cincoenta trazendo uma família numerosa.

Depois de Otacílio era o morador mais perto da gente.

Seus filhos mais novos foram meus fiéis camaradas de caçadas de baleadeira,pescaria de ramada balaio e anzol nos açudes e riachos quando enchiam naqueles Cariris Velhos, onde confesso que vivi “meus verdes anos”.

Chiquinho,seu filho mais novo na época (depois vieram outros) era um menino “doentinho de nascença” e devia ter lá os seus seis,sete anos ,a idade que tem hoje o meu Gabriel.

Chiquinho era magrinho,tinha as unhas roxas e não andava muito.

Na verdade ficava o tempo sentado num banco ou tamborete acompanhando com triste olhar eu e seus irmãos a correr pelo vasto e bem varrido terreiro da casa de taipa onde morava.

Um dia Chiquinho morreu e eu,minhas duas irmãs mais novas (que também já se foram) os seus irmãos e outros camaradas fomos providenciar o enterro do “anjinho” que era ele.

Começamos pelas flores que fomos buscar na fazenda de tio Luiz que cultivava um jardim bem cuidado.

Recordo de nós na volta correndo alegremente com flores nas mãos entre o capinzal e partidos de cana que eram abundantes na nossa propriedade.

Alegres, todos, como se Chiquinho não tivesse morrido.

É que a morte, naquela época, não estava ainda nos nossos juvenis planos.

Algum tempo depois seriam as minhas lindas irmãs .

Coisas da vida.

“Seu Chico” que era compadre do meu pai, morou ainda mais de vinte anos conosco, quando meu pai velho e cansado da lida foi-se embora pra cidade.

Seu Chico já tinha ido antes.

Morreram meu pai, minha mãe e pelo menos mais dois irmãos mais velhos meus.

E ele foi ficando.

Até fazer cem anos quando com prazer fui abraçá-lo.

Com disposição, bom humor e excelente memória, agora foi a sua vez aos cento e seis anos.

Vítima de um descaso de sucessivos (des)governos que nunca cuidaram da saúde desse país.

Um troço chamado Chicungunha, nos levou impiedosamente das nossas histórias aquele pequeno e doce gigante chamado Chico.

Chico Mendes

Salve ele.

Aonde estiver…

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