Depois de o Congresso estipular as novas datas das eleições municipais, as definições sobre o processo de votação cabem agora à Justiça Eleitoral, que enfrenta os desafios de organizar um pleito atípico, em meio à pandemia de coronavírus. Como o distanciamento social minimiza o risco de contágio, a falta de mesários e um provável aumento da abstenção são algumas preocupações. No Rio, a atuação das milícias é outro fator de alerta — a pandemia atrapalhou o planejamento que previa um aumento de fiscalização no primeiro semestre em áreas com atuação criminosa mais intensa. Em Brasília, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) discute medidas como a ampliação do horário de votação, para diminuir filas, e parcerias para a doação de máscaras e álcool em gel.
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Promulgada ontem, a emenda constitucional estabelece que o primeiro turno da eleição aconteça em 15 de novembro, enquanto a segunda fase do pleito ocorrerá no dia 29 do mesmo mês. Segundo o juiz Luiz Márcio Pereira, coordenador de Fiscalização e Propaganda do Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro (TRE-RJ), o medo de ir aos locais de votação já está evidente entre eleitores e mesários. Para evitar aglomerações, o TSE avalia estender o horário de votação. Uma hipótese é que o início seja às 7h ou às 8h, com o encerramento às 20h. Normalmente, as seções ficam abertas entre 8h e 17h.
É preciso definir, no entanto, como viabilizar a extensão em locais como as comunidades ribeirinhas da Amazônia, em que o acesso é feito com barco ou helicóptero, sem a possibilidade de transporte noturno.
Também há a hipótese de dividir os horários de votação por faixa etária, mas um problema seria o caso de famílias que comparecem unidas às seções. Caso um dos familiares fosse proibido de votar no horário previsto para um parente, provavelmente não voltaria ao local mais tarde, aumentando as abstenções.Está em debate o cancelamento da multa para quem não comparecer, desde que haja uma justificativa relacionada ao risco de exposição.
— Temos recebido muitas mensagens de eleitores dizendo claramente: “Estou com medo de votar”. Terá que ser feito um trabalho de comunicação muito grande. Há um preocupação nossa com a abstenção, que compromete a legitimidade do pleito. Há uma questão que é muito importante: muitos mesários estão dizendo que não querem trabalhar, e eles precisam ser treinados — afirmou o magistrado. — É uma situação inusitada. Tudo que foi programado foi por terra.
Cada seção eleitoral conta com quatro mesários. O TSE está discutindo se eles vão se se revezar ao longo do tempo de votação ou se ficarão juntos na seção o dia todo. Em outra frente, o Tribunal negocia com a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) doações de equipamentos buscando a proteção de mesários e eleitores. A ideia do presidente do TSE, Luís Roberto Barroso, é não gastar dinheiro público com esses produtos, já que não existe orçamento previsto para essa despesa nas eleições.
— Vamos prover toda a segurança possível para os mesários e para o eleitorado, inclusive com o fornecimento de máscaras, álcool em gel, luvas onde necessário, com demarcação no chão, talvez com extensão do horário — disse Barroso.
O ministro ressaltou que todas as medidas serão tomadas depois de consultas a médicos e cientistas:
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— Estaremos tomando todas as providências razoáveis e possíveis. Nada por achismo. Estamos ouvindo a comunidade médica e os especialistas para cada passo. Portanto, empregando meios científicos e em compromisso com a sociedade e com o Brasil.
Ainda há dúvida se a biometria será usada. A tecnologia garante a identidade do eleitor que comparece à urna. No entanto, a desvantagem é que, com a necessidade de conferir a digital de cada um, o tempo de espera para votar é maior. Caso a opção seja manter a biometria neste ano, quem votar não vai poder usar álcool em gel nas mãos, para não comprometer as digitais. A alternativa será usar álcool líquido.
Segurança é desafio
No Rio, há o elemento extra da preocupação com a interferência do crime no processo eleitoral. O presidente do TRE-RJ, desembargador Cláudio Brandão, havia acertado , em janeiro, com o governador Wilson Witzel, a realocação de policiais militares para as zonas eleitorais dos municípios. A mudança ocorreria em março, mas, diante da pandemia, os PMs foram deslocados para a fiscalização do isolamento social, muitos foram atingidos pelo vírus, e o planejamento naufragou.
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— A preocupação segue. São situações de segurança pública. Não temos como prender, mas temos que fiscalizar. Sabemos das dificuldades que alguns candidatos enfrentam em comunidades dominadas por milicianos. Precisamos trabalhar com inteligência. E hoje estão proibidas as incursões em comunidades. Será um desafio — afirmou o juiz Luiz Márcio Pereira, citando a decisão do Supremo Tribunal Federal que vetou operações em favelas durante a pandemia.
Outro reflexo no processo eleitoral, de acordo com pesquisadores, será o aumento da relevância das redes sociais, já que a interação nas ruas deverá ser menor em relação a eleições anteriores:
— A internet ganha uma dimensão muito grande. Em 2018, ficou evidente que candidato que não migrasse para a busca de votos na internet não estaria na corrida. O uso da tecnologia é incontornável. Estabelecer os limites disso é o grande desafio — avaliou o professor de ciência Política da UnB Carlos Machado.