Governadores e prefeitos podem impor medidas de isolamento, decide STF

Em sessão por videoconferência, o Supremo Tribunal Federal decidiu nesta quarta-feira (15) que, além do governo federal, os governos estaduais e municipais têm poder para determinar regras de isolamento, quarentena e restrição de transporte e trânsito em rodovias em razão da epidemia do coronavírus.

Os nove ministros presentes à sessão votaram de forma unânime em relação à competência de estados e municípios para decidir sobre isolamento. Por maioria, o plenário entendeu ainda que o Supremo deveria deixar expresso que governadores e prefeitos têm legitimidade para definir quais são as chamadas atividades essenciais, aquelas que não ficam paralisadas durante a epidemia do coronavírus.

Os ministros julgam uma ação do PDT contra medida provisória editada pelo presidente Jair Bolsonaro com o objetivo de concentrar no governo federal o poder de editar uma norma geral sobre os temas.

A MP alterou uma lei de fevereiro, que previa quais ações poderiam ser tomadas durante a crise gerada pela pandemia do coronavírus.

O partido considerou que as modificações na legislação feriam a Constituição. Também argumentou que é tarefa de União, estados e municípios, em conjunto, a competência para estabelecer políticas relacionadas à saúde; e que só por lei complementar – para a qual é necessária maioria absoluta de votos no Senado e na Câmara – é possível estabelecer regras de cooperação no tema entre União, estados e municípios.

Em março, o ministro Marco Aurélio Mello, relator do caso, concedeu liminar (decisão provisória) para reforçar que tanto União como estados e municípios têm competência para legislar sobre medidas de saúde. Portanto, no entendimento dele, governadores e prefeitos podem estabelecer regras de isolamento, quarentena e restrição de transporte e trânsito em rodovias e portos.

Na sessão desta quarta, o ministro defendeu a confirmação da liminar pelo plenário. Marco Aurélio Mello disse que a MP foi editada para combater os efeitos da pandemia, mas faltou entendimento.

“Há de ter-se a visão voltada ao coletivo, e talvez o que falte nesta quadra, presidente, é entendimento”, afirmou.

Alexandre de Moraes afirmou que a competência comum não permite que todos os entes federais possam fazer tudo porque isso gera uma “bagunça ou anarquia”.

De acordo com o ministro, a coordenação das medidas compete ao governo federal, mas, a partir de critérios técnicos, estados e municípios, dentro de seus espaços normativos, podem fixar regras de distanciamento social, suspensão de atividade escolar e cultura, circulação de pessoas.

Ele ressaltou que governadores conhecem melhor as realidades regionais e os prefeitos, as locais. “Não é possível que a União queira ter monopólio da condução administrativa da pandemia. É irrazoável”, declarou.

Edson Fachin defendeu que estados e municípios podem, inclusive, estabelecer quais são as atividades essenciais, aquelas atividades que não sofrem restrições de funcionamento durante a crise. Ele afirmou que a atuação do governo federal deve seguir parâmetros, inclusive, internacionais.

“As regras constitucionais não servem apenas para proteger a liberdade individual, mas também o exercício da racionalidade coletiva, isto é, da capacidade de coordenar as ações de forma eficiente”, afirmou.

Luís Roberto Barroso se declarou impedido de participar do julgamento “por motivo de foro íntimo”, mas aproveitou para cobrar unidade em torno das ações para combater a crise.

“Eu acho que o enfrentamento dessa questão da covid-19 [doença provocada pelo coronavírus] exige coordenação, liderança, racionalidade e exige cooperação entre os entes estatais. Não pode ser tudo centralizado e nem de uma forma que cada um corra para um lado”, afirmou.

Para a ministra Rosa Weber, da saúde é uma competência comum administrativa e que “cabe ao Brasil valer-se da estrita federalização para evitar o caos”.

Segundo a ministra, é possível que sejam editadas medidas diferentes e até mais rígidas de controle do coronavírus diante das realidades de cada local, respeitando o princípio da proporcionalidade.

Ricardo Lewandowski afirmou que o federalismo cooperativo exige que governos federal, estadual e municipal se apoiem mutuamente. O ministro disse que é preciso diálogo e liderança cooperativa.

“Já foi sublinhado aqui com muita precisão que estados e municípios não podem ser alijados nessa batalha porque eles têm o poder, o dever de atuar”, disse.

Gilmar Mendes disse que o presidente da República não pode atropelar competências federativas, assim como os estados e município não podem atropelar as competências da União.

“Nós temos no eixo SP, RJ e Minas 100 milhões de pessoas. A metade dos habitantes do Brasil vive nesse eixo. Portanto, sobre os governadores desses estados, recai uma imensa responsabilidade. (…) Tudo isso faz crescer a responsabilidade dos estados e municípios. Por isso, que esta Corte tem afirmado que, a despeito da competência da União, subsistem as competências dos estados e municípios para lidar com o tema”, afirmou.

Segundo Luiz Fux, o Supremo já decidiu que normas gerais da União deveriam prestigiar a legislação local, exatamente porque representava uma proteção mais eficiente do que a norma federal. O ministro citou ainda que Estados e municípios devem ouvir as agências reguladoras, que podem sugerir os melhores meios para se determinar uma atividade como essencial.

“Acompanho voto do ministro relator, com a interpretação conforme, conferindo a todas as unidades federadas o poder de enumerar atividades essenciais, devendo ouvir agências reguladoras por falta de expertise para definir as atividades essenciais”, afirmou.

Último a votar, Dias Toffoli entendeu que não era preciso deixar expresso que estados e municípios podem definir quais são os serviços essenciais. Para o presidente do Supremo, isso já seria implícito a partir do entendimento do plenário.

“Na decisão do relator, essa conclusão já está clara o bastante, o suficiente”, disse o ministro.

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