O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, arquivou nesta quinta-feira (1º) o inquérito aberto para investigar atos antidemocráticos ocorridos no primeiro semestre do ano passado e abriu uma nova frente de investigação — esta para verificar a existência de uma organização criminosa digital que atenta contra a democracia.
O inquérito arquivado investigava a organização e o financiamento de manifestações que, no ano passado, foram às ruas para defender causas antidemocráticas e inconstitucionais, como o fechamento do Congresso e do STF, e a adoção de um novo AI-5, o ato mais repressor da ditadura militar.
O ministro determinou que o novo inquérito vai analisar “a presença de fortes indícios e significativas provas apontando a existência de uma verdadeira organização criminosa, de forte atuação digital e com núcleos de produção, publicação, financiamento e político absolutamente semelhante àqueles identificados no Inquérito 4.781, com a nítida finalidade de atentar contra a Democracia e o Estado de Direito”.
O arquivamento atende a um pedido da Procuradoria-Geral da República. O ministro explicou que a abertura de uma nova frente de apuração não fere entendimentos do Supremo sobre os poderes do Ministério Público e se baseia em “fortes indícios” reunidos ao longo das investigações .
Segundo Moraes, os elementos reunidos pela Polícia Federal apontam que a organização tem atuado contra a estabilidade institucional, propagando discurso de ódio e pode ter contado com o auxílio de deputados bolsonaristas, como Eduardo Bolsonaro, filho do presidente Jair Bolsonaro, e Bia Kicis, presidente da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara. A conexão com os parlamentares seria a partir das relações do blogueiro Allan dos Santos.
“A partir da posição privilegiada junto ao Presidente da República e ao seu grupo político, especialmente os Deputados Federais Bia Kicis, Paulo Eduardo Martins, Daniel Lúcio da Silveira, Carolina de Toni e Eduardo Bolsonaro, dentre outros, além e particularmente o Ten-Cel. Mauro Cesar Cid, ajudante de ordens do Presidente da República, a investigação realizada pela Polícia Federal apresentou importantes indícios de que Allan dos Santos tentou influenciar e provocar um rompimento institucional, particularmente nos eventos ocorridos nos dias 20/04/2020, 26/04/2020 e 06/05/2020.”
Essa organização, segundo a PF, se articularia em núcleos de produção, publicação, financiamento e político.
“O foco desse grupo seria a exclusão dos Poderes Legislativo e Judiciário na tríade do sistema de freios e contrapesos da Constituição, ora atacando seus integrantes, especialmente, no caso do Congresso Nacional, dos Presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, e dos ministros do Supremo Tribunal Federal, ora pregando a própria desnecessidade de tais instituições estruturais da Democracia brasileira.”
Moraes afirma que essa organização prega “de maneira direta o afastamento da Democracia representativa, com o retorno do Estado de Exceção, a partir do além do uso de meios comuns para a realização dos ataques, observa- se parcial identidade dos sujeitos investigados, pelo uso de contas em redes sociais próprias, pelo controle ou responsabilidade por contas inautênticas, ou referente a pessoas jurídicas, blogs e páginas específicas mantidas na internet”.
A PF apontou ainda que há “sérios indícios de uso da rede de computadores interna do Palácio do Planalto, da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, por meio de assessores de parlamentares reconhecidamente ligados ao objeto de investigação nestes autos, para divulgar ataques às instituições democráticas, seus integrantes e, deliberadamente contra o regime democrático e o Estado de Direito estabelecidos pela Constituição Federal”.
Os investigadores apontam ainda que o “objeto econômico do grupo é obter financiamento com verbas públicas para a propagação de ideias antidemocráticas e contra o regime democrático brasileiro e o Estado de Direito”.
Moraes cita que parte dos planos de buscar recursos públicos pode ter se concretizado, uma vez que Allan dos Santos e Eduardo Bolsonaro trataram de indicações para Secretaria de Comunicação.
De acordo com a decisão do ministro, o novo inquérito terá prazo inicial de 90 dias e será conduzido pela equipe da delegada Denisse Dias Rosas Ribeiro, da Polícia Federal, em razão da conexão com o inquérito arquivado.
Em manifestações ao Supremo, nos dias 4 e 17 de junho, a Procuradoria-Geral da República defendeu o arquivamento do inquérito em relação a investigados com foro privilegiado no STF, e o prosseguimento do caso na primeira instância em relação aos alvos que não contam com a prerrogativa de foro.