Nas gestações de duas mulheres de Juazeirinho, no Cariri da Paraíba, pesquisadores encontraram novos males que o vírus zika e a epidemia de microcefalia associada a ele são capazes de causar. São os primeiros diagnósticos comprovados de transmissão intrauterina do vírus. O estudo revelou deformações severas no sistema nervoso. Crianças tão gravemente afetadas que a medicina e a sociedade não lhes podem oferecer um final feliz.
O estudo levou ao sequenciamento genético do zika no Brasil. E à descoberta, na análise de outros seis casos de bebês nascidos com zika de mães com sintomas da doença na gravidez, de um problema ainda não associado ao vírus. Um deles tinha artrogripose severa, uma malformação das articulações. Deforma os membros, impede movimentos. Agora, já são quatro as crianças com artrogripose com suspeita de zika — duas delas em gestação —, todas da Paraíba.
Publicado este mês numa revista científica internacional, o artigo alerta para novas complicações trazidas pelo zika, na “Ultrasound in Obstetrics & Gynecology”, seção “Physician alert” (“Alerta médico”); o título é “Zika virus intrauterine infection causes fetal brain abnormality and microcephaly: tip of the iceberg?” (“Infecção intrauterina pelo vírus zika causa anomalia cerebral e microcefalia: a ponta do iceberg?”).
“É possível que os casos reportados de microcefalia representem só as crianças mais severamente afetadas, e que recém-nascidos com doenças menos severas, afetando não somente o cérebro mas outros órgãos, não tenham sido ainda diagnosticados”, diz o artigo assinado por seis cientistas, entre eles Adriana Melo, diretora do Instituto de Pesquisa Professor Joaquim Amorim Neto, em Campina Grande; e Ana Bispo, do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz).
Especialistas em microcefalia alertam que esse é o problema mais evidente, mas não o único. A neurocientista Patrícia Garcez é uma das poucas especialistas do Brasil em microcefalia. Quando soube da emergência sanitária devido à microcefalia, não dormiu por dias, de preocupação.
— Toda essa geração de bebês que nasce agora precisa de acompanhamento médico. A microcefalia é um sinal evidente. Mas, se o zika pode afetar o sistema nervoso a ponto de causar algo tão devastador e até então raro, também pode, em tese, provocar uma série de outros distúrbios de desenvolvimento, como surdez, epilepsia, problemas de cognição, de fala, motores, que não são aparentes no recém-nascido. A criança pode não ser microcéfala e ter distúrbios — diz ela, pesquisadora do Laboratório de Neuroplasticidade da UFRJ e do Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino.
Patrícia está preocupada com o tipo de atenção que receberão as crianças nascidas durante a epidemia.
— A maioria dos casos de zika é assintomática. Mães podem não saber que tiveram a doença. Crianças nascidas agora devem ter um acompanhamento atento dos médicos por anos — destaca.