Por que Ariano Suassuna evitava chamar capital da Paraíba de João Pessoa

O escritor Ariano Suassuna, conhecido por obras como 'O auto da compadecida', em foto de 30 de abril de 2011, em São Paulo — Foto: Felipe Rau/Estadão ConteúdoNatural da capital da Paraíba, mas cidadão taperoense e crescido em Recife, Ariano Suassuna construiu vida e obra resgatando o Nordeste para representar o país. “Pintando o Nordeste, ele se comunicou com o mundo todo”, declarou o neto do escritor paraibano, João Suassuna. Mesmo com um vínculo tão forte com a cidade, já que nasceu dentro do Palácio da Redenção, sede do Executivo paraibano, Ariano Suassuna cresceu evitando chamar a capital da Paraíba de João Pessoa.

É que um outro vínculo, ainda mais forte do que o seu nascimento, pulsava na memória. O pai de Ariano, João Urbano Suassuna, foi assassinado em 1930, como o filho mesmo dizia, “de forma traiçoeira, numa emboscada”, como consequência dos acontecimentos políticos que marcaram a época na Paraíba.

A tragédia envolveu três homens: João Pessoa, João Suassuna e João Dantas. Os acontecimentos foram uma mancha na histórica política da Paraíba na primeira metade do século XX.

Entre 1928 e 1930, a Paraíba era presidida por João Pessoa, sucessor de João Suassuna. João Dantas, um advogado e militante político, apoiava Suassuna e era opositor a João Pessoa – oposição que se intensificou com a Revolução de Princesa.

No dia 26 de julho de 1930, na Confeitaria Glória, no Centro de Recife, João Dantas matou João Pessoa à queima-roupa.

Muitos dos considerados perseguidos politicamente pelo governador João Pessoa decidiram pelo exílio político após a sua morte, indo morar em outros estados. A maior parte deles estabeleceu residência no estado vizinho Pernambuco, como foi o caso de João Suassuna, particularmente atingido pelas rivalidades políticas, especialmente as patrocinadas pelos Pessoa devido à sua relação familiar com João Dantas.

Essas disputas políticas e pessoais culminaram no assassinato de João Suassuna, pouco mais de dois meses depois, no Centro do Rio de Janeiro, enquanto tentava provar sua inocência perante acusações feitas por seus adversários políticos à respeito da morte de João Pessoa.

No momento da morte, João Suassuna carregava no bolso do paletó um carta, “dizendo que poderia ser que acontecesse alguma coisa, que o Brasil vivia um momento muito difícil, muito turbulento e tumultuado, que caso viessem a tirar a vida dele, que ele não queria que ninguém nutrisse o espírito de vingança, que toda a família, todos os filhos fossem criados em acordo com os preceitos da religião cristã”, conta o neto de Ariano.

Após isso, manteve-se, de geração em geração, a tradição de não verbalizar a palavra João Pessoa por carregar o sangue e a dor da família.

“P-A-R-A-H-Y-B-A. A gente chama a capital de Parahyba, com H-Y. Quando ele [Ariano Suassuna] nasceu, se chamava Nossa Senhora das Neves ou então Parahyba do Norte. E a gente reconhece com H-Y, como era a grafia da época”, explica João Suassuna, neto do dramaturgo paraibano.

Havia um ressentimento, isso é fato, mas como o historiador e neto de Ariano, João Suassuna, revela, “nunca houve, em tempo algum, e por ninguém, nenhum movimento de revanchismo”.

Nessa época, Ariano tinha apenas três anos de idade, o suficiente para inserir na sua trajetória a história do pai. “É a vida de um menino sempre em busca do seu rei, do seu guia, que era seu pai”, diz João Suassuna sobre a poesia do avô.

Ele explica que é exatamente nesse momento que a família sai da capital, do Litoral, e vai para a cidade de Taperoá.

“O vovô tinha dificuldade de falar [sobre a morte do pai] porque mexia muito com ele. Mas ele dizia que a literatura dele era uma forma de protestar e reagir à memória do pai”, detalha o neto.

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